terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Experiência com quadrinhos na escola

Estava fazendo uma pesquisa na internet sobre outro assunto e me deparei com esse relato de experiência com quadrinhos na escola. Adorei e estou tomando a liberdade de reproduzí-lo no blog, citando a fonte, como sempre.


Por: Cláudia Sanches

Imagine a cena: um aluno da segunda série do Ensino Fundamental sentado em frente ao computador da escola, lendo e escrevendo histórias em quadrinhos. Essa é uma das atividades desenvolvidas nas aulas de Língua Portuguesa do Colégio Éden, no Rio de Janeiro. Nelas, a criança tem a oportunidade de trabalhar produção textual, discurso direto e indireto e, também, conteúdos de outras disciplinas, de maneira lúdica e inovadora.

Essa aula faz parte de um projeto que visa ao ensino da Língua Portuguesa através de gibis, realizado, há mais de 10 anos, com os alunos do C.A., primeira e segunda séries do Ensino Fundamental. Segundo a equipe de professores, o quadrinho é um excelente recurso no processo de aprendizagem da língua, uma vez que retrata muito bem o universo infantil: “Aqui no colégio, o gibi está presente na sala de aula e na biblioteca, representando muito bem a literatura. O objetivo de se trabalhar com uma variedade textual é apresentar a eles os diferentes níveis de linguagem, e o gibi dá essa possibilidade, pois utiliza uma linguagem mais coloquial, comum ao universo oral do aluno. Aliás, aqui, tudo pode ser usado como material de discussão, até bula de remédio e nota de supermercado”, brinca Ângela Sixel, professora do C.A.

Segundo ela, o aluno lida com quadrinhos sem preocupar-se com as letras durante o primeiro semestre, no qual ele constrói as histórias oralmente. “Na Alfabetização, trabalha-se essencialmente com as imagens. Nesse momento, os alunos são estimulados a falar os nomes dos personagens. Logo depois, perguntamos com quais deles mais se identificam, e dessa conversa partimos para a separação de sílabas. Pedimos, então, a eles que separem os nomes de cada personagem. Chamamos a atenção, também, para o tipo de letra e para as rimas. Entre as atividades mais comuns com essa turma está a apresentação das revistas na biblioteca. As crianças manuseiam o material e depois pedimos a elas que recontem a história para os amigos, estimulando, assim, a capacidade de raciocínio e o encadeamento lógico do pensamento”.

Na primeira série, o aluno já trabalha com a pesquisa formalmente. Nessa fase, ele traz tirinhas de jornais e revistas para a sala de aula. Sônia Silveira, professora da primeira série, conta que os quadrinhos ajudam muito nos esclarecimentos sobre os conteúdos como, por exemplo, a separação de sílabas: “em determinada aula de leitura, um dos alunos se deparou com a palavra passarinho separada em sílabas e fui obrigada a falar sobre a matéria antes do tempo. Expliquei a eles que as letras “ss” eram separadas por pura convenção. Mas acabou surgindo um questionamento dessa regra estabelecida, feito pelos próprios estudantes”, exemplifica a professora.

Nessa proposta, também são trabalhados discursos descritivos, produzidos por eles a partir da linguagem visual. “Pedimos que o aluno descreva o que está acontecendo nos desenhos e eles recriam histórias fascinantes”, conta Sônia.

Na primeira série, essa leitura já possibilitou trabalhos muito interessantes sobre a metáfora, uma vez que essa linguagem é muito comum nos quadrinhos. Com uma tirinha do escritor e cartunista Miguel Paiva, trazida por um aluno, a professora solicitou que a turma prestasse atenção na quantidade de metáforas ligadas ao corpo humano. “Eles conseguiram encontrar mais de 200 exemplos dessa figura de linguagem”, conta ela. Alguns deles foram falar pelos cotovelos, cabelo nas ventas, meter o nariz em tudo, cara de pau etc. “Com isso, os alunos compreenderam que o ser humano utiliza seu próprio corpo como referencial para tudo, e, daí, partimos para uma aula de Ciências sobre o Corpo Humano”, explica Sônia, que acha muito importante esse intercâmbio entre as várias disciplinas, previsto nos Parâmetros Curriculares Nacionais.

Na segunda série, período em que as crianças já são capazes de perceber claramente as diferentes maneiras de expressão, elas podem aprimorar muito a escrita a partir do trabalho com revistas. A possibilidade de exercícios é ilimitada. A partir dos balõezinhos, nos quais é usada a linguagem direta, trabalha-se a passagem do discurso direto para o indireto, estimulando os alunos a reescreverem de diversas maneiras.

Recentemente, a segunda série também está utilizando os quadrinhos no computador, através de um programa na Internet, que possui as imagens dos personagens de Maurício de Souza, com os balões em branco (representando o travessão), onde as crianças criam seus discursos. No programa, existe a opção de escolher os cenários, os movimentos dos personagens, as suas expressões faciais, discursos e espaços.

A professora Kátia Sanches acha que, apesar de muito recente, o trabalho tem sido de grande valia, porque os alunos têm a oportunidade de treinar a seqüência do pensamento lógico e de trabalhar a figura do narrador.

Além de ser um recurso na apresentação do conteúdo, as tirinhas promovem discussões sobre os valores da sociedade. Segundo Sônia, essa troca de idéias é comum a todas as turmas, desde o C. A. até a 2.a série. “É impressionante como os quadrinhos nos levam a discussões críticas. Eles trazem a visão da criança, que difere muito do ponto de vista do adulto, e apresentam temáticas que levam à troca de idéias muito enriquecedoras. As crianças falam sobre os seus valores familiares, seus conflitos e dúvidas”, diz ela.

Muitos pais ainda não compreendem o valor desse tipo de texto (histórias em quadrinhos) e alguns, além disso, a consideram uma leitura imprópria para a sala de aula e para a biblioteca – onde, segundo eles, deveria haver somente obras literárias. Porém, as professoras do colégio procuram esclarecer que essa leitura pode desencadear no aluno o prazer de ler e que o gibi é, na verdade, um trampolim para o livro. Elas também ressaltam que não existe um texto melhor do que outros, há, sim, diferentes estilos, como explica Sônia, que fez uma pesquisa sobre o tema:

“Não há texto com maior peso que outros, mas, sim, com diferentes funções. Concluímos que os melhores leitores começam a ler através de revistas em quadrinhos. Todos os grandes leitores, adultos ou crianças, passaram por essa fase. Essa leitura é muito interessante para o alunos, porque nela existe o desenho confirmando a escrita, que, por sua vez, aborda questões peculiares ao universo deles” – conclui.

Colégio Éden
Tel: (0xx21) 553-5443

Fonte: Jornal Educar

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