segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Chris Ware tem um título lançado no Brasil


Ainda que muito material de qualidade continue inédito no Brasil, alguns dos mais representativos títulos e autores das histórias em quadrinhos alternativas americanas têm ganhado edições nacionais. Robert Crumb, Art Spiegelman, Charles Burns, Craig Thompson, Dash Shaw e Guy Delisle (este, canadense) são apenas alguns dos nomes que podem ser encontrados nas seções reservadas aos quadrinhos nas livrarias brasileiras. A eles, soma-se agora Chris Ware, um dos mais cultuados quadrinistas contemporâneos. Ainda que seus trabalhos sejam elogiadíssimos pela crítica - e tenham também público cativo -, somente este ano uma obra de Ware chega por aqui.

Jimmy Corrigan - O menino mais esperto do mundo sai no Brasil uma década depois de publicado nos Estados Unidos. A história em quadrinhos conseguiu uma repercussão que inclui o American Book Award, prêmio até então nunca concedido para uma HQ. O reconhecimento não é à toa. No álbum, Ware apresenta uma arte muito original (ainda que beba de referências visuais facilmente reconhecíveis) e uma narrativa gráfica que o aproxima tanto de quadrinhos clássicos quanto do formato do romance na literatura. O que, na prática, é nada mais nada menos o mesmo que os autores citados anteriormente têm feito.

Ware, no entanto, tem um trabalho distinto, próprio. O que chama a atenção logo à primeira vista são os desenhos: limpos e detalhados, com uma paleta de cores em tons pastéis. A narrativa gráfica é intrincada. Admirador da arquitetura, das artes plásticas, da publicidade e - claro - dos quadrinhos das primeiras décadas do século 20, o autor nascido na cidade de Omaha (estado de Nebraska), hoje morador de Chicago, reprocessa todas essas referências à sua maneira, com um estilo inconfundível.

O texto acompanha a qualidade dos desenhos. O Jimmy do título são três e, de certa forma, um só. A história começa no tempo presente (meados dos anos 1980). Jimmy Corrigan é um solitário homem de 36 anos que viaja para encontrar pela primeira vez o pai que nunca conheceu. Paralelamente, são apresentadas as histórias dos outros Jimmys. Um deles é o protagonista quando criança, o outro, seu avô na infância - que, assim como ele, vive uma relação complicada com um pai negligente, ausente e, na maior parte do tempo, indiferente.

Em todos os casos, Jimmy usa sua imaginação para escapar de uma realidade opressora. Nesses momentos, o trabalho de Ware mostra todo seu potencial, com fluxos de consciência, sonhos e delírios narrados com habilidade cinematográfica. Ao longo da HQ, Jimmy tenta entender a rejeição que o tornou uma pessoa tão retraída, antissocial e infeliz. Inspirada parcialmente em experiências do próprio Ware (que só conheceu o pai já adulto), Jimmy Corrigan - O menino mais esperto do mundo é uma obra especial por apresentar de maneira visualmente deslumbrante dramas dos mais reais, sem apelar para o sentimentalismo, para o melodrama ou a autopiedade.

Gênese criativa
Antes de virar uma referência dos quadrinhos contemporâneos, Chris Ware publicou em uma série de revistas alternativas, entre elas, a RAW, editada por Art Spiegelman. O artista veterano, por sua vez, quando novato também passou por publicações alternativas (muitas delas, a convite do amigo Robert Crumb). Parte dessa produção foi compilada em 1978, em um álbum chamado Breakdowns. Duas décadas depois, esse mesmo título foi relançado com uma história adicional recente, na qual Spiegelman comenta seus primeiros contatos com os quadrinhos. Breakdowns - Retrato do artista quando jovem chega agora ao Brasil.

A edição é supercaprichada, com capa dura, formato gigante (25,4cm x 35,6cm), papel e impressão de primeira qualidade. O conteúdo interessa, principalmente, aos fãs do autor - pois, como o título deixa claro, são os trabalhos de Spiegelman no começo da carreira, ainda moldando seu estilo. Antes de se consagrar com o essencial Maus (umas das mais relevantes graphic novels já publicadas), Spiegelman testou diversas técnicas e referências - das HQs às artes plásticas. É este o mérito de sua fase inicial: a experimentação.

E se nenhuma dessas primeiras histórias chega a ser um clássico, algumas merecem especial atenção. Há no álbum aquela que daria início a Maus (batizada com o mesmo título da graphic novel) e a dolorosa Prisioneiro do planeta Inferno, na qual ele narra o dia em que encontrou a mãe morta e como isso o afetou. O epílogo que fecha o livro ajuda a entender não apenas a trajetória de Spiegelman, mas também parte da história dos quadrinhos underground nos Estados Unidos.

JIMMY CORRIGAN - O MENINO MAIS ESPERTO DO MUNDO
De Chris Ware. 384 páginas. Quadrinhos na Cia. R$ 49.

BREAKDOWNS - RETRATO DO ARTISTA QUANDO JOVEM
De Art Spiegelman. 312 páginas. Quadrinhos na Cia. R$ 79.

Fonte: Correio Brasiliense

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