segunda-feira, 23 de novembro de 2009

El Sistema: Anime na Venezuela


Desde 1975 – bem antes de Hugo Chávez meter suas mãos na Venezuela – existe no país um programa governamental conhecido como "El Sistema", dedicado a ensinar a qualquer criança a tocar um instrumento a sério. Por conta disso, 250.000 crianças e adolescentes se dedicam a música clássica por mais de quatro horas ao dia, sob a batuta de 15.000 professores (lembrem que a Venezuela tem 26 milhões de habitantes), sob metodologia pedagógica. Com isso, o país tem 120 escolas de música e 180 orquestras infantis. E em algum momento alguém se deu conta de que isso vale uma história e tanto. E assim surgiu a co-produção internacional El Sistema, que envolve entre outros a produtora francesa Prélude Animation e o estúdio japonês Hibari (o mesmo de Moonlight Mile).

A história aborda cinco garotos venezuelanos no conservatório de Caracas (na verdade quatro garotos venezuelanos e um japonês, filho de um empresário nipônico residente na Venezuela), que acaba ingressando por conta de algumas voltinhas do roteiro em um conservatório para garotos pobres. Mas ele sofre de uma invalidez progressiva e está disposto, ao lado dos outros garotos, a participar do Concurso Internacional de Música de Tóquio – e eles não querem nada menos do que o primeiro prêmio.

O cenário é o bairro (existente na vida real) de Chabolas, descrito como um bairro extremamente pobre, e o elenco é pensado para refletir a multiplicidade étnica do país (67% da população é mestiça) e suas imensas disparidades sociais (35% da população vive abaixo da linha de pobreza). E o roteiro também reflete isso. Uma das meninas, por exemplo, se agarra à música clássica como a única forma de ter alguma chance de sair da pobreza. O menino mais pobre é meio negro, meio descendente de indígenas, e trabalha para ajudar sua família. A outra menina (ao centro da imagem no topo) é filha de um militar de influência local, e por aí vai. Pessoalmente falando, algo nisso me lembra a miríade que compunha a garotada da novela mexicana Carrossel. E de certa forma, faz sentido essa inclinação por um anime latino.

Nos anos setenta, os japoneses paravam por conta de dramas que os envolviam e faziam seus leitores se emocionar genuinamente. Comparando com os animes e mangás dos dias de hoje, os dramas parecem muito menos verdadeiros do que os animes de antigamente. Talvez porque antigamente os autores fossem veteranos que passaram pelas dores da construção de seu país no pós-guerra. Sabiam o que era dor. As novas gerações de autores que os sucederam não conheceram realmente uma era de apertos. Talvez a renovação do mangá e do anime como estética tenha realmente que passar pela produção estrangeira caso queira sobreviver. E para isso, os criadores tem que parar de pensar que estão no Japão.

A equipe de "El Sistema", pelo visto, já percebeu o caminho das pedras: buscar as histórias aonde elas estão. É assim que o mundo pode contribuir com a estética dos animes e dos mangás – trazer novos temas, novos dramas, e novos personagens, que possam acrescentar algo de novo a um universo que começou japonês, mas que dia a dia, se torna mundial. Mal posso esperar para ver essa série. E o website da produção pode ser visto aqui.

Fonte: Maximum Cosmo

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